Em meio a impasse do brexit, Theresa May anuncia renúncia
A primeira-ministra do Reino Unido, Theresa May, anunciou na manhã desta sexta (24) que deixará a liderança do Partido Conservador no dia 7 de junho, abrindo caminho para uma troca no comando do país nos próximos meses, possivelmente até meados de julho.
A corrida para sucedê-la no comando do Partido Conservador (e, por extensão, do país) deve durar entre seis e oito semanas e só começará por volta de 10 de junho. Até que esse processo termine, May seguirá no cargo de primeira-ministra.
O ex-prefeito de Londres Boris Johnson, defensor de um brexit duro, talvez até sem acordo com a União Europeia (UE), é dado como favorito para sucedê-la.
Em pronunciamento na sede do governo, em Londres, May surgiu diante das câmeras com os olhos marejados e a voz embargada. Disse lamentar não ter conseguido finalizar o processo britânico de saída da União Europeia, o brexit, e afirmou ter sido uma honra ser a segunda mulher a ocupar o posto de chefe de governo, “mas não a última” —Margaret Thatcher foi a primeira.
May assumiu o posto em julho de 2016, depois da renúncia de David Cameron, fragilizado pelo resultado surpreendente do plebiscito sobre o brexit, um mês antes –ele era favorável à permanência do Reino Unido no clube europeu e deu sinal verde à votação para apaziguar a ala mais anti-UE do Partido Conservador, mas certo de que seu lado venceria.
Depois de um ano e meio de negociações, sua substituta conseguiu, no fim de 2018, fechar um acordo com a UE para o desligamento do Reino Unido do consórcio continental, mas ele foi desde então rejeitado três vezes pelo Parlamento em Londres.
No processo, ela resistiu a duas moções de desconfiança, uma delas submetida por seus próprios colegas de partido.
A pressão para sua saída voltou a subir no começo desta semana, quando a líder apresentou um plano “retocado” para tentar convencer os deputados a endossar o “divórcio” do bloco europeu.
A nova proposta abria a possibilidade de uma segunda consulta popular sobre o brexit —o Legislativo, uma vez aprovado o acordo, teria a prerrogativa de definir se ela de fato aconteceria.
O aceno enfureceu os correligionários de May. Até seus ministros a repreenderam, dizendo que o item não havia sido acordado em reunião do gabinete.
Resultado de um plebiscito realizado em 2016, a saída do Reino Unido da União Europeia dividiu o país, derrubou um primeiro-ministro, ameaça um segundo e levou a um impasse entre Londres e Bruxelas; entenda como tudo aconteceu e quais os principais desafios para o “brexit” Daniel Leal-Olivas – 12.dez.18/AFP
Entenda o ‘brexit’
Promessa eleitorais, trocas de liderança e dificuldades de acordo marcam a saída do Reino Unido da União Europeia.
Outro item do pacote recauchutado previa alguma modalidade de união aduaneira pós-brexit entre britânicos e europeus –cuja implantação também dependeria do consentimento dos deputados.
A ideia era conquistar apoio nas fileiras do Partido Trabalhista, principal força da oposição, que defende uma união aduaneira permanente depois da separação.
De nada adiantou. Conscientes da debilidade do governo May e da possibilidade de reversão de suas medidas por uma nova gestão, os trabalhistas não morderam a isca, o que só tornou ainda mais insustentável a permanência da primeira-ministra no cargo.
No pronunciamento de sexta, ela listou conquistas de sua administração, como o saneamento das contas públicas e a redução da taxa de desemprego a níveis recordes, e disse ter feito tudo quanto foi possível para convencer os deputados a aprovar o acordo de saída da UE.
“Infelizmente, não consegui. Para ser bem-sucedido, meu ou minha sucessora precisará achar consenso parlamentar onde eu não encontrei. Esse consenso só será alcançado se todos os lados do debate estiverem dispostos a ceder.”
Líder do Partido Trabalhista, Jeremy Corbyn afirmou que a adversária tomou a decisão correta e que, qualquer que seja o resultado da corrida conservadora para sucedê-la, o futuro chefe de governo deve convocar eleições gerais assim que assumir.
De seu lado, presidentes e primeiros-ministros europeus expressaram preocupação com a despedida de May. O temor é de que seu sucessor não faça grandes esforços para evitar um divórcio litigioso da UE, sem acordo –e, portanto, sem fase de transição, para dar tempo às partes para se adaptarem ao novo status da relação.
A disputa pelo comando do país deve ter, além de Johnson, o deputado Dominic Raab, ex-ministro de May (justamente na pasta encarregada de organizar o brexit) e considerado ainda mais “pavio curto” do que o ex-prefeito londrino.
Após a renúncia, Johnson classificou May como “estoica” por seus esforços. Durante uma palestra na Suíça, ele também defendeu que a atual data marcada para o brexit seja respeitada independente do que acontecer. “Nós vamos deixar a União Europeia no dia 31 de outubro, com acordo ou sem acordo”, disse ele.
Na ala mais moderada, são aventados os nomes de Jeremy Hunt, atual ministro das Relações Exteriores, e Michael Gove, titular do Ambiente e apoiador obstinado da em breve ex-primeira-ministra.
Seja quem for o escolhido para ser o novo líder do partido, precisará ter seu nome aprovado no Parlamento para se tornar o novo primeiro-ministro e substituir May e a tendência é que isso aconteça, já que a atual aliança entre os conservadores e o partido norte-irlandês DUP tem maioria na Casa.
Boris Johnson, 54. O ex-secretário do Exterior e ex-prefeito de Londres apoiou o plano do brexit após May anunciar renúncia Henry Nicholls/Reuters
Candidatos à sucessão de Theresa May
Premiê britânica pode deixar cargo após votações do brexit.
O que acontece agora?
– No dia 7 de junho, uma sexta-feira, May deixará oficialmente a liderança do Partido Conservador
– Ela, porém, continuará como primeira-ministra até que um novo líder seja escolhido
– A partir do dia 10, a sigla deve começar o processo de escolha, que demorará de um a dois meses
– Previsão é que ao menos 17 pessoas de candidatem para a vaga
– Na primeira etapa do processo, os 313 parlamentares conservadores votam nos candidatos
– Os dois mais votados passam para o segundo turno, no qual votam todos os mais de 100 mil filiados ao partido
– Quem receber mais voto se torna o novo líder dos conservadores e, por isso, assume como primeiro-ministro
Fonte: Folha de São Paulo